idoso na internet

O Perigo da Super Exposição de Idosos à Internet.

em Bem Estar por

Tendo em vista a Pandemia de Covid-19 que estamos vivendo, sabemos que os idosos são o grupo social que mais está sofrendo. Por estarem mais sujeitados a desenvolver um quadro grave desta infecção, acabam necessitando de um isolamento social mais radical.

Por isso, prontamente, os profissionais da Saúde priorizaram a divulgação de atividades físicas, lúdicas e sociais nas mídias digitais, para toda população. Inclusive, atividades para que os mais velhos não permanecessem enclausurados sem distrações. E é notável a quantidade de opções positivas que temos em mãos devido à internet. São inúmeros os aplicativos, as rádios, os sites de filmes, e programas diversos para mantermos uma interação virtual.

Em 2017, o Brasil alcançou 126,3 milhões de usuários de internet,  um aumento de 10,2 milhões de pessoas em comparação com 2016. No entanto, o maior crescimento aconteceu entre os idosos. Foram 2.3 milhões pessoas com mais de 60 anos que passaram a acessar a internet pela primeira vez em 2017. (1) Esse público costuma entrar na internet para se relacionar nas redes sociais com familiares e amigos. E, em alguns casos, recebem ajuda dos filhos e netos para navegar na rede.

Fazendo um salto para as duas últimas semanas, agora em meio ao isolamento social, sabemos que a quantidade de pessoas acessando a internet é muito maior (2).  Entretanto,  não sabemos quais são os problemas que os idosos podem desenvolver ao ficarem expostos muito tempo à internet. Isso porque são poucos os estudos que nos trazem quaisquer dados nessa população. Ainda mais sobre algumas doenças e síndromes comuns entre os mais jovens quando permanecem muito tempo conectados.

Vamos dar um exemplo. 

Em 2004, Patrick J McGinnis (3) nomearia pela primeira vez uma síndrome chamada Fear of Missing Out (FoMO) – medo de perder/ medo de não acompanhar se traduzido livremente para o Português. Essa síndrome é caracterizada por um desejo de permanecer o tempo todo conectado com o que outras pessoas estão fazendo. Geralmente, utilizando sites de mídias sociais na internet como Facebook ou Instagram, por exemplo. (4) (5);

Mas, ao longo da última década, foram analisadas diversas perspectivas dessa síndrome em populações de jovens, adultos e inclusive crianças. Todas as pesquisas chegam à conclusão que as pessoas que permanecem muito tempo na internet podem desenvolver algumas experiências negativas. Principalmente, por não saberem lidar com a tecnologia. Ou por essa não trazer as respostas esperadas. (6) São comuns os relatos de ansiedade, mau humor, irritabilidade e depressão nas populações estudadas.

Em 2015, Paasonen e colegas  (7) exploraram as respostas de indivíduos que não conseguiram fazer uso da tecnologia conforme esperavam. Os termos para descrever essa dificuldade chamam atenção: “desânimo, horror, dor, estresse, enfurecimento, fúria e impotência”.

Ainda, segundo Hadlington & Scase  (2018) o isolamento social está relacionado com a síndrome de FoMO (6).  Dentre outros sintomas dessa síndrome estão a necessidade de checar o Facebook constantemente. Seja antes de dormir ou logo ao acordar. Além de mandar mensagens de texto, ou emails enquanto faz outra tarefa (como dirigir um carro, por exemplo). São pessoas que se distraem com o mundo ao redor para permanecer online, e acabam apresentando maior tendência a reações de estresse com a tecnologia.

Isso significa que a atividade digital mantém um impulso compulsivo no indivíduo, dominando os pensamentos, emoções e comportamentos. Chamamos isso de “Silência”, que é um dos motivos de um paciente queixar-se de dores crônicas, por exemplo.

E aqui temos outro problema. No final da década de 1980, McCrae & Costa (8) já sugeriam que essas pessoas podem exibir comportamentos mais hostis e reações emotivas perante uma falha. São mais irritadiças, irracionais e respondem de maneira agressiva ou punitiva.

Talvez não seja o caso de qualquer dos nossos familiares apresentar todas essas queixas e sintomas. Entretanto devemos nos dar conta que o idoso está entrando em contato com pessoas mais jovens. E estes sim podem sofrer de crises ou algumas dessas doenças mentais, visto que são muitas as pessoas acessando as mesmas plataformas na internet de maneira descontrolada. E, infelizmente, as discussões perdem a racionalidade para se tornarem confrontos nas timelines, muitas vezes com linguagem ofensiva, abusos verbais e ameaças.

Portanto, é importante nos atentarmos com aquilo que nossos parentes mais velhos estão vendo na internet e ao que nós também estamos vendo, independentemente de nossa idade.

O trabalho de Bendayan & Blanca (9) está entre os poucos estudos que incluem idosos em sua pesquisa, avaliando o vício no Facebook. Para nosso alívio, a importância dessas interações diminuíram com o avançar da idade. Por outro lado o número permanece alto em adultos de idade mais avançada.

Finalmente, não podemos nos esquecer do Whatsapp. A ferramenta é utilizada pela maior parte da população com internet no Brasil. Assim, os idosos também formam o grupo de usuários que mais aumentou desde 2017. (10)

Neste caso, o perigo são as “fakenews”. Por ainda ser uma plataforma da qual temos maior intimidade com os integrantes (grupos de conversas com nossos familiares, ou com colegas de trabalho, etc) é comum manifestarmos nossas opiniões em discussão sobre uma matéria ou um vídeo. Mas é importante lembrar que os sintomas são os mesmos de qualquer outra ferramenta da intenet. Ou seja, é possível desenvolver um quadro de tristeza, ansiedade ou a sensação de impotência ao permanecer muito tempo interagindo nessa rede.

Mas então o que fazer para modular nosso isolamento social com a impulsão digital?

Se você está utilizando a internet por muito mais tempo que antes, sugiro que tenha cuidado com as pessoas com quem interage. Lembre-se sempre que a pessoa do outro lado (especialmente aquelas que você não conhece pessoalmente) podem não ser honestas e sinceras. Além disso, abandone qualquer tipo de interação abusiva! Se necessário, peça ajuda!

Minha sugestão é manter a atenção para com quem estamos entrando em contato nas redes, visto termos um número importante de pessoas sofrendo de distúrbios psíquicos. E essas pessoas podem se relacionar com você ou com nossos pais, avós, e outros familiares idosos que começaram recentemente a frequentar as mídias digitais.

Para os que se preocupam com os mais velhos, uma idéia é auxiliar nossos pacientes ou amigos e parentes a se desligarem desses meios digitais, e voltar suas atenções a tarefas artesanais, lúdicas e atividades físicas, que não sejam guiadas unicamente pelo professor ou canal online. 

Portanto, incentive-os a pegar aquele instrumento musical encostado. Ou, finalmente criar coragem de fazer a horta no apartamento. São atividades que mantém a mente ocupada com o mundo real, de maneira saudável e longe das atividades virtuais.

Rafael Turqueto Duarte é Fisioterapeuta pela Universidade Federal de São Carlos (2011), Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina – CETE (2013). Trabalha com Terapias Manuais – Mobilização do sistema nervoso – Neurodynamic Solutions (2011), Mobilização Mulligam (2014), praticante de Qi Gong desde 2000 e estudante de conceitos e tratamentos para dor. Atende no Instituto Saúde & Dor.

Referências Bibliográficas

1 – https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/23445-pnad-continua-tic-2017-internet-chega-a-tres-em-cada-quatro-domicilios-do-pais

2 –  https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/03/coronavirus-altera-consumo-de-internet-e-fragiliza-usuarios-mais-pobres.shtml

3 – http://www.harbus.org/2004/social-theory-at-hbs-2749/

4 – Beyens, Ine & Frison, Eline & Eggermont, Steven. (2016). “I don’t want to miss a thing”: Adolescents’ fear of missing out and its relationship to adolescents’ social needs, Facebook use, and Facebook related stress. Computers in Human Behavior. 64. 1-8. 10.1016/j.chb.2016.05.083.

5 – Przybylski, Andrew & Murayama, Kou & DeHaan, Cody & Gladwell, Valerie. (2013). Motivational, Emotional, and Behavioral Correlates of Fear of Missing Out. Computers in Human Behavior. 29. 1841-1848. 10.1016/j.chb.2013.02.014. 

6 – (Lee Hadlington, Mark O. Scase. End-user frustrations and failures in digital technology: exploring the role of Fear of Missing Out, Internet addiction and personality. Heliyon 4 (2018) e00872.

doi: 10.1016/j.heliyon.2018. e00872)

7- Paasonen, Susanna. (2015). As Networks Fail: Affect, Technology, and the Notion of the User. Television & New Media. 16. 701-716. 10.1177/1527476414552906. 

8 – McCrae, R.R., Costa, P.T., 1987. Validation of the five-factor model of personality across instruments and observers. J. Pers. Soc. Psychol. 52 (1), 81-90

9 – Bendayan, Rebecca & Blanca, María. (2019). Spanish version of the Facebook Intrusion Questionnaire. Psicothema. 31. 10.7334/psicothema2018.301. 

10 – https://oglobo.globo.com/economia/idosos-sao-grupo-que-mais-cresce-entre-os-usuarios-de-internet-aponta-pnad-2017-23316773

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